top of page

Filme "Comer, Rezar e Amar": Uma Jornada de Autodescoberta e Cura Psicológica

Atualizado: 23 de out.

Por: Silvia Rocha

 

Em um mundo que frequentemente nos impulsiona para a busca incessante por conquistas externas — um casamento estável, uma carreira de sucesso, a casa dos sonhos — o que acontece quando, mesmo ao alcançar tudo isso, nos deparamos com um profundo vazio interior? O filme "Comer, Rezar e Amar" [2], baseado no best-seller autobiográfico de Elizabeth Gilbert [1], mergulha nessa questão universal com uma sensibilidade tocante. A jornada de Liz Gilbert, interpretada de forma luminosa por Julia Roberts, é um convite para refletirmos sobre a coragem de abandonar o que é seguro, mas insatisfatório, em busca de uma conexão mais autêntica consigo mesma e com a vida. Este artigo propõe uma análise aprofundada do filme, explorando suas múltiplas camadas sob a ótica da psicologia, da sociologia e da espiritualidade, e buscando compreender como a jornada de Liz pode nos inspirar a encontrar nosso próprio caminho de cura e autodescoberta. 


O cartaz do filme "Comer, Rezar e Amar", que convida o espectador a uma jornada de autodescoberta.
Cartaz do filme "Comer, Rezar e Amar", que convida o espectador a uma jornada de autodescoberta.

A Crise Existencial e a Busca por Sentido: Uma Perspectiva da Logoterapia

A jornada de Liz Gilbert em "Comer, Rezar e Amar" é um retrato vívido de uma crise existencial, um tema central na Logoterapia de Viktor Frankl. Liz, apesar de ter uma vida aparentemente perfeita, se vê mergulhada em um profundo vazio existencial, uma sensação de falta de sentido que a leva a questionar todas as suas escolhas. Frankl postula que a principal força motivadora do ser humano é a "vontade de sentido", e a ausência desse sentido pode levar a um estado de sofrimento e apatia, que ele denominou de "neurose noogênica" [6].

 

A viagem de Liz para a Itália, Índia e Bali pode ser interpretada como uma busca ativa por sentido em três dimensões fundamentais da existência humana: o prazer, a espiritualidade e o amor. Na Itália, ela se entrega aos prazeres da comida e da cultura, redescobrindo a alegria de viver o presente. Na Índia, ela mergulha na meditação e na busca por uma conexão transcendente, um aspecto essencial da Logoterapia, que reconhece a dimensão espiritual do ser humano. Em Bali, ela se abre para o amor e para a conexão com o outro, encontrando um novo sentido em sua capacidade de se doar e de construir relacionamentos autênticos. A jornada de Liz nos mostra que, mesmo diante do sofrimento e da incerteza, temos a liberdade de escolher nossa atitude e encontrar um sentido para nossa vida.

 

A viagem de Liz é marcada pelo encontro com diferentes arquétipos, como o Sábio (representado por seus mestres espirituais na Índia e em Bali) e a Sombra (seus medos, inseguranças e padrões de comportamento destrutivos).
A viagem de Liz é marcada pelo encontro com diferentes arquétipos, como o Sábio (representado por seus mestres espirituais na Índia e em Bali) e a Sombra (seus medos, inseguranças e padrões de comportamento destrutivos).

A Jornada como Processo Psicanalítico: De Freud à Transformação Pessoal

Sob a ótica da psicanálise, a jornada de Liz em "Comer, Rezar e Amar" pode ser vista como uma metáfora do processo analítico, uma busca profunda por autoconhecimento e transformação. Inicialmente, Liz se encontra em um estado de repetição de padrões de relacionamento insatisfatórios, o que Freud chamaria de "compulsão à repetição". Ela busca preencher um vazio interno através do outro, em uma dinâmica que a leva à frustração e à estagnação da libido [7].

 

A viagem de Liz pode ser interpretada como um processo de elaboração psíquica, onde cada destino representa uma etapa de sua análise pessoal. A Itália, com sua ênfase na comida e no prazer, simboliza a fase oral, a incorporação de novas experiências e a redescoberta do prazer de viver. A Índia, com sua introspecção e meditação, representa a elaboração do luto e da culpa, um trabalho psíquico fundamental para a superação de traumas e padrões inconscientes. Em Bali, Liz alcança uma reconciliação interna, aprendendo a estar só e a amar sem perder a si mesma, o que pode ser visto como o alcance de uma posição edípica mais madura. A transformação de Liz, na perspectiva de Bion, pode ser entendida como uma "mudança catastrófica", um processo de desorganização e reorganização da estrutura psíquica, que ocorre através do confronto com verdades dolorosas e da superação de resistências.

 

A Individuação e o Encontro com o Self: Uma Leitura Junguiana

A jornada de Liz em "Comer, Rezar e Amar" também pode ser analisada sob a perspectiva da psicologia analítica de Carl Jung, como um processo de individuação, a busca pelo encontro com o Self, o centro da personalidade. Liz, no início do filme, está desconectada de si mesma, vivendo uma vida que não reflete sua verdadeira essência. Sua jornada é um chamado para a aventura, um convite para sair da zona de conforto e explorar as profundezas de sua psique [3].

 

A viagem de Liz é marcada pelo encontro com diferentes arquétipos, como o Sábio (representado por seus mestres espirituais na Índia e em Bali) e a Sombra (seus medos, inseguranças e padrões de comportamento destrutivos). Ao confrontar sua Sombra, Liz integra aspectos de si mesma que antes eram negados, tornando-se mais completa e autêntica. A experiência na Índia, com a prática da meditação, pode ser vista como um mergulho no inconsciente, uma busca pela conexão com o Self. Em Bali, Liz encontra o equilíbrio entre o mundo interno e o externo, entre a espiritualidade e o amor, alcançando um estado de maior integração e plenitude. A jornada de Liz, portanto, é um belo exemplo do processo de individuação, um caminho de autodescoberta e transformação que nos leva ao encontro de nossa verdadeira essência.

 


Em Bali, Liz encontra o equilíbrio entre o mundo interno e o externo, entre a espiritualidade e o amor, alcançando um estado de maior integração e plenitude.
Em Bali, Liz encontra o equilíbrio entre o mundo interno e o externo, entre a espiritualidade e o amor, alcançando um estado de maior integração e plenitude.

Abordagens Sociológicas

A jornada de Liz em "Comer, Rezar e Amar" também pode ser analisada sob uma perspectiva sociológica, como um reflexo das transformações sociais e culturais do mundo contemporâneo. O filme questiona os papéis de gênero tradicionais e a pressão social sobre as mulheres para que se casem, tenham filhos e sigam um roteiro de vida pré-estabelecido. A decisão de Liz de abandonar seu casamento e sua carreira para viajar sozinha é um ato de rebeldia contra as expectativas sociais, uma busca por autonomia e liberdade. O filme também aborda a questão da globalização e do intercâmbio cultural, mostrando como o contato com diferentes culturas pode ampliar nossa visão de mundo e nos ajudar a questionar nossos próprios valores e crenças. A jornada de Liz pela Itália, Índia e Bali é uma imersão em diferentes modos de vida, que a leva a repensar sua própria identidade e seu lugar no mundo.

 

Abordagens Espiritualistas-Energéticas-Holísticas

Sob uma perspectiva espiritualista, a jornada de Liz é uma busca pela conexão com o divino, com a energia universal e com sua própria alma. A viagem para a Índia, em particular, é um mergulho na espiritualidade oriental, com a prática da meditação, do yoga e do canto de mantras. Liz busca transcender o ego e se conectar com uma dimensão mais profunda de sua existência. A experiência em Bali, com o encontro com o curandeiro Ketut Liyer, também tem uma forte conotação espiritual. Ketut representa a sabedoria ancestral, a conexão com a natureza e com o mundo espiritual. Ele ajuda Liz a encontrar o equilíbrio entre o corpo, a mente e o espírito, e a se abrir para o amor de uma forma mais plena e consciente.

 

Sinais para Observar no Filme "Comer, Rezar e Amar"


  1. Insatisfação persistente: A insatisfação de Liz com a própria vida se revela em diversas áreas, como nos relacionamentos, no trabalho e na forma como se enxerga.

  2. Medo da mudança: Medos e inseguranças surgem quando Liz decide deixar para trás a vida antiga e embarcar em uma jornada desconhecida.

  3. Busca por prazer e conexão: Em cada etapa da viagem, Liz procura experiências que tragam prazer e conexão, seja por meio da comida, da meditação ou dos vínculos afetivos [4].

  4. Confronto com a sombra: Momentos intensos mostram Liz enfrentando seus medos, inseguranças e padrões de comportamento autodestrutivos.

  5. Transformação e reencontro consigo mesma: Ao longo da narrativa, Liz passa por uma profunda transformação, saindo de um estado de vazio existencial até reencontrar a própria essência e a alegria de viver [5].


Sob uma perspectiva espiritualista, a jornada de Liz é uma busca pela conexão com o divino, com a energia universal e com sua própria alma.
Sob uma perspectiva espiritualista, a jornada de Liz é uma busca pela conexão com o divino, com a energia universal e com sua própria alma.

O Corpo que Fala e a Alma que Escuta

Comer, Rezar e Amar é mais do que uma narrativa de viagem — é um convite à escuta profunda da alma. A trajetória de Liz toca porque revela o quanto o silêncio interior pode ser ensurdecedor quando não se vive com autenticidade. A insatisfação, o medo, a busca por prazer e a transformação não são apenas etapas de uma jornada externa, mas reflexos de um corpo que clama por atenção e uma alma que deseja se reconectar.


Ao longo do filme, Liz aprende a decifrar os sinais que o corpo e as emoções lhe enviam. Essa escuta sensível encontra eco no artigo “Doenças Digestivas e o Corpo que Fala”, que aprofunda a relação entre sintomas físicos e conflitos emocionais. Assim como Liz sente o peso de uma vida que não a nutre, o artigo mostra como o sistema digestivo pode refletir aquilo que não é digerido emocionalmente — sejam relações, escolhas ou padrões de vida.


A correlação entre o filme e o texto é clara: ambos apontam para a importância de reconhecer os sinais do corpo como mensagens da alma. A dor, o desconforto e o vazio não são inimigos, mas mensageiros de uma verdade que precisa ser ouvida. Liz só encontra paz quando se permite escutar, sentir e transformar.


Que a história de Liz inspire a coragem de ouvir o coração e também o corpo — esse sábio mensageiro — para que cada um possa embarcar em sua própria jornada de autodescoberta e cura. Para aprofundar essa reflexão, recomendo a leitura do artigo “Doenças Digestivas e o Corpo que Fala”, que oferece uma perspectiva sensível e integrativa sobre o que o corpo revela quando a alma silencia.


Um abraço, Silvia Rocha 


Silvia Rocha é psicóloga (CRP 06/182727), terapeuta integrativa e hipnoterapeuta master
Silvia Rocha é psicóloga (CRP 06/182727), terapeuta integrativa e hipnoterapeuta master.


Silvia Rocha é psicóloga (CRP 06/182727), terapeuta integrativa e hipnoterapeuta master, com graduação em Psicologia em 2005. Fundadora do Espaço Vida Integral, atua com foco no bem-estar emocional, crescimento pessoal e fortalecimento de relacionamentos, oferecendo terapias individuais, de casal, sistêmicas e familiares.





 

Possui cursos e formações em Psicoterapia Breve e Focal, Psicotrauma, Psicologia de Emergências e Desastres, Doenças Psicossomáticas, Psicanálise, Coaching, Psicologia Transpessoal, Terapias Quânticas/Holísticas, Constelação Sistêmica Familiar e Apometria Clínica Avançada. Com mais de 30 anos de experiência na área corporativa, MBA em Gestão Empresarial pela FGV/RJ e Pós-Graduação em Negócios pela FAAP/SP, Silvia também realiza Coaching Pessoal.

 

Contato 

Instagram e Facebook: @silviarocha.terapeuta

WhatsApp: (12) 98182-2495

 

Referências Bibliográficas e Cinematográficas

[1] Gilbert, E. (2006). Comer, Rezar, Amar. Objetiva. 

[2] Murphy, R. (Diretor). (2010). Comer, Rezar, Amar [Filme]. Columbia Pictures. 

[3] Análise do filme Comer, rezar e amar na teoria de jung. TrabalhosFeitos.com. Recuperado em 25 de setembro de 2025, de https://www.trabalhosfeitos.com/ensaios/An%C3%A1lise-Do-Filme-Comer-Rezar-e/410389.html 

[4] 5 lições de Comer, Rezar, Amar para não esquecer nunca. Eurekka. Recuperado em 25 de setembro de 2025, de https://blog.eurekka.me/licoes-de-comer-rezar-amar/ 

[5] Análise do filme 'Comer, rezar e Amar' baseado na Terapia de Aceitação e Compromisso. (2020, 2 de agosto). [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=ujnVcCxS2uQ 

[6] Crisis Existencial y Espiritual. Logoforo.com. Recuperado em 25 de setembro de 2025, de https://logoforo.com/crisis-existencial-y-espiritual/ 

[7] Cinema e Psicanálise - "Comer, Rezar, Amar". (2020, 15 de maio). [Vídeo]. YouTube. https://www.youtube.com/watch?v=-EvXmBFJiuY

Comentários


  • Whatsapp
bottom of page